Um dos mais fascinantes personagens da história da medicina é o alemão Paul Ehrlich. Há pouco mais de um século, seus trabalhos revolucionaram a medicina e o modo de pensar dos médicos. Ehrlich foi agraciado com o Prêmio Nobel de Medicina em 1908, por sua contribuição ao campo da imunologia, prêmio dividido com Elia Metchnikoff, este pela descoberta da fagocitose. O cientista germânico havia sido indicado ao Nobel todos os anos de 1901 a 1909 e voltou a ser lembrado em 1912 e 1913.
Paul Ehrlich nasceu em 1854 e completou o curso de medicina na Universidade de Leipzig em 1.878, com a tese doutoral: “Contribuição para a teoria e prática das colorações histológicas” (“Beiträge sur Theorie und Práxis der histologischen Färbung”). Nessa dissertação, comparou a coloração dos tecidos orgânicos com a tintura dos tecidos têxteis, sustentando que em ambos os casos a coloração se devia a reações químicas.
Durante toda a sua carreira científica, Ehrlich permaneceu obstinadamente ligado ao estudo das colorações biológicas, que, aliado ao seu talento em pesquisa médica, com intuição, imaginação e capacidade de dedução muito aguçadas, foi responsável por um grande número de descobertas. Essas lhe valeram o reconhecimento de pioneirismo em pelo menos três grandes áreas da ciência médica: a hematologia, a imunologia e a quimioterapia. O alicerce do conhecimento nessas áreas foi construído com base em seus trabalhos.
Foi Paul Ehrlich quem lançou as bases científicas para o desenvolvimento da hematologia. Entre suas grandes contribuições está a identificação e diferenciação de vários tipos de células do sangue. Já na sua dissertação de conclusão do curso de medicina, por meio de suas colorações ele descreveu, de maneira extremamente precisa, um novo tipo de células, os mastócitos, e antecipou o papel fisiológico dessas células. Em estudos posteriores com coloração de esfregaços de sangue periférico ele conseguiu reconhecer e diferenciar células que se coravam de maneira diferente conforme o uso de corantes ácidos ou básicos, preparados a partir da anilina. Com isso, identificou claramente os eosinófilos e basófilos e, com um corante neutro capaz de corar tanto células acidófilas como basófilas, descreveu um novo grupo de leucócitos que se corava em violeta e que chamou de neutrófilos. Estava “inventado” o hemograma, ou pelo menos o leucograma.
Em um livro escrito com seu colaborador Adolf Lazarus, Ehrlich já identificou diversas anomalias hematológicas como leucocitose, leucopenia e alterações relacionadas com anemia e leucemia. Outras importantes contribuições suas foram a primeira descrição da anemia aplástica e a diferenciação de alguns tipos de leucemia.
Paul Ehrlich teve também fundamental e pioneiro papel no desenvolvimento da imunologia, ao criar conceitos revolucionários como o de receptores imunológicos e é considerado também o pai da quimioterapia, que serão assunto de próximos posts.
Referências
1. Reyna, Oscar Pamo. Paul Ehrlich: de las tinciones a las balas mágicas. Academia Nacional de Medicina Lima-Perú, Anales. 2004, Vol. 200, pp. 108-116.
2. Schwartz, Robert S. Paul Ehrlich´s Magic Bullets. New England Journal of Medicine. 2004, Vol. 350, 11, pp. 1079-1080.
3. Crivellato, Enrico, et al. Paul Ehrlich’s doctoral thesis: a milestone in the study of mast cells. British Journal of Haematology. 2003, Vol. 123, 1, pp. 19-21.
4. Venita, Jay. Paul Ehrlich. Archives of Pathology and Laboratory Medicine. June de 2001, Vol. 125, pp. 724-725.
5. Ehrlich, Paul. Partial cell functions. Nobel Lecture, December 11, 1908 :304-320. [Online] [Citado em: 27 de julho de 2008.]
6. Drews, Jürgen. Paul Ehrlich: Magister Mundi. Nature. september de 2004, Vol. 3, pp. 1-5.