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Zelig de Woody Allen. Ilustração obtida do site www.leclownlyrique.wordpress.com |
Dentre os fatos que modificaram o curso da medicina, um dos mais significativos foi o advento do estetoscópio na prática clínica.
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capa do livro de Laennec |
O inventor do aparelho foi médico francês René Theophile Hyacinthe Laennec (1781-1826). No seu livro De l’ auscultation médiate, ou Traité du diagnostic des maladies des poumons et du cooeur, escrito em 2 volumes em 1819, ele conta que a ideia para a invenção do aparelho ocorreu-lhe em 1816, quando estava examinando uma paciente jovem, com sintomas de doença cardíaca e a percussão e inspeção do tórax foram de pouca ajuda. A ausculta direta era “inadmissível pela idade e sexo da paciente”. Lembrou-se então de um bem conhecido princípio acústico de que era possível ouvir um alfinete na extremidade de uma peça de madeira, colocando o ouvido na outra ponta. “Imediatamente, com essa ideia, enrolei um caderno de papel, como um cilindro e coloquei uma ponta na região do coração e a outra na minha orelha”. Para sua surpresa, percebeu que os sons do coração eram muito mais claros do que seriam com a ausculta imediata.
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Estetoscópio de Laennec. Fonte: sciencemuseum.com |
A partir daí Laennec continuou suas observações e foi aperfeiçoando o dispositivo, experimentando materiais como papel, bambu e madeira. Depois de várias experiências optou por um cilindro de madeira, com perfuração central, dividido em duas partes para facilitar o transporte. Para explorar os sons da respiração ele utilizava a extremidade afunilada, que era retirada quando queria ouvir o coração. Laennec deu o nome de estetoscópio ao seu invento, utilizando-se dos termos gregos stethos (tórax) e skopé (observação, exame).
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Ilustração do estetoscópio obtida da tradução inglesa de 1834 do livro de Laennec, editado e comentado por John Forbes |
No seu livro, Laennec apresenta detalhes dos sons observados nos diversos sistemas e órgãos. Dedica atenção especial ao aparelho respiratório. Mostra minúcias das alterações encontradas nas diversas doenças do tórax, estabelece critérios para diagnóstico de várias doenças repiratórias. Asma, tuberculose, pleurisia, pneumonia e várias outras doenças respiratórias são detalhadamente abordadas. Dedica um capítulo para explicar a importância do ruído de crepitação para o diagnóstico da pneumonia.
O sucesso do seu aparelho foi imediato e é um dos grandes marcos da história da medicina. A partir dele, Skoda mais tarde estabeleceu as bases do método clínico utilizado, em sua essência, até hoje. (
veja aqui mais sobre a revolução da medicina no século XIX). Embora tenha sofrido numerosos aperfeiçoamentos com o tempo, o aparelho moderno mantém praticamente os mesmos princípios da física utilizados no original.
A invenção do estetoscópio está perto de completar 200 anos e ele continua sendo um imprescindível instrumento de diagnóstico. Mais que isso, é um símbolo inconfundível da medicina e talvez sua maior representação.
A realmente interessante crônica referida pela Lolinha pode ser vista em http://www.recantodasletras.com.br/cronicas/3900567
A Casa Fretin ainda existe (Rua São Bento). Tem até uma crônica (postei no Facebook) interessante de uma historiadora.
Obrigado, Rui. O primeiro estetoscópio a gente nunca esquece. O meu era um BD, mais modesto, presente do meu pai. Mas eu invejava mesmo o estetoscópio daquele professor de cardiologia, baiano, cheio de pontas.
Neto, lembro bem que ganhei meu primeiro estetoscópio e o esfigmomanômetro (aparelho de aferir pressão arterial)de uma tia Josefa, irmã de minha mãe, assim que passei no vestibular. Foi um presente tão marcante que, 43 anos depois, tenho hoje partes do estetoscópio, pois as mangueiras ressecaram e o relógio e a pêra de inflar o manguito estão ainda em uso. São da melhor marca que existia à época (Tycos) e foram comprados na Casa Fretin em São Paulo, nem sei essa loja existe mais. Maravilhoso texto e informações que eu desconhecia.
Já pensou em escrever mais um livro ; °