Ligando o epônimo à pessoa – A Síndrome de Down

O epônimo existente na Síndrome de Down refere-se ao médico inglês John Langdon Haydon Down (1828 – 1896), o pioneiro na descrição e classificação das características da síndrome. Ele foi um aluno brilhante da Universidade de Londres e imediatamente após a sua formatura em 1958, foi nomeado superintendente médico do Royal Earlswood Asylum for Idiots, que era a maior instituição para doentes mentais na Inglaterra e abrigava cerca de 400 internos. Down melhorou muito os cuidados de higiene do local, contratou novos profissionais, proibiu todas as punições aos doentes, organizou atividades lúdicas, ensinou ofícios aos pacientes internados e humanizou a assistência, elevando consideravelmente a reputação da instituição.

Imagem de John Down
John Down
1828-1896

Em 1866, John Down publicou o seu histórico ensaio Observations on an ethnic classification of idiots, em que discorreu sobre as características que observara nos internos do sanatório e no qual individualizou a síndrome, à qual mais tarde teria seu nome associado. Naquela época, estavam em voga as teorias etnológicas que buscavam correlacionar os contornos do crânio com a função intelectual. O formato da cabeça dos indivíduos das diferentes raças demonstraria diferenças nas capacidades intelectuais e de aprendizado. O conceito de raça foi muito utilizado para explicar e mesmo legitimar as desigualdades entre os homens.

Embora em outras ocasiões tivesse demonstrado um pensamento liberal e antiescravagista, John Down apoiou-se nessas teorias racistas e eurocêntricas, muito disseminadas na sua época, para elaborar sua teoria. Valeu-se também dos conceitos de Johann Friedrich Blumenbach, que classificava as raças humanas em cinco grupos: caucasianos, mongóis, americanos, malaios e etíopes.

No seu texto, Down destacou: “um grande número dos idiotas congênitos são mongóis típicos. Isso é tão marcante que quando colocados lado a lado, é difícil acreditar que os espécimes comparados não sejam filhos dos mesmos pais”. Ele identificou também o caráter congênito daquilo que chamou de “idiotia mongólica” e acreditava que as características físicas dos pacientes se tratava de uma degeneração racial, ou seja, um europeu assumindo características dos mongóis, uma regressão. Apontava a tuberculose como uma das causas dessa degeneração. Os termos “mongolismo” e “mongoloides” foram adotados a partir daí para designar a síndrome e seus portadores.

Ao longo do tempo, essas expressões, como não podia deixar de ser, adquiriram conotação preconceituosa e pejorativa, reforçando a discriminação e a depreciação tanto dos pacientes, como das pessoas nascidas na Mongólia. Em 1959, praticamente um século depois, o francês Jerome Lejeune sepultou definitivamente a ideia de degeneração racial, ao demonstrar que aquela síndrome era devida a uma anomalia genética, caracterizada pela presença de um cromossomo extra no par 21. Somente a partir daí é que a denominação que remetia a características raciais foi sendo proscrita, passando a ser denominada como trissomia do cromossomo 21, trissomia do 21 ou Síndrome de Down.

Referências

1. Down, JL. Down JL. Observations on a ethnic classification of idiots. London Hospital Reports 1866;3:259-.
2. Robays, J. Van. John Langdon Down (1828-1896). Facts Views Obgyn. 2016, Vol. 8, pp. 131-136.
3. Ward, O.C. John Langdon Down: the man and the message. Downs Syndr. Res. Pract. Aug;6(1):19-24., 1999.
4. Fresquet, José L. John Langdon Down (1828-1896). Historia de la Medicina. [Online] [Citado em: 17 de 02 de 2020.] https://www.historiadelamedicina.org/down.html.
5. Dunn, PM. Dr Langdon Down (1828-1896) and ‘mongolism’. Archives of Disease in Childhood 1991; 66: 827-828.


Revisão: Ana Raquel Costa Geraldes

Neto Geraldes

Um novo historiador que gosta da medicina e um velho médico que gosta da história.

Este post tem um comentário

  1. Anônimo

    O epônimo da Sindrome de Down é um dos mais impactantes, tanto na evolução dos conhecimentos das doenças mentais, nos cuidados com esses doentes e no preconceito racial!

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