A medicina seguiu caminhos diferentes no Império Romano do Ocidente e do Oriente a partir do século IV da era cristã. Enquanto que no Ocidente observou-se um processo de estagnação do conhecimento e definhamento da atuação médica, que ficou praticamente restrita à ação dos religiosos, a consolidação do Império Romano do Oriente (ou Bizantino), teve grande importância na história da medicina. Suas principais contribuições foram a preservação e irradiação do conhecimento produzido pelos gregos e a manutenção da atividade médica e do ensino da medicina, além de eventuais avanços técnicos ou conceituais.
Dentre os principais autores do Império Romano do Oriente destaca-se Oribásio, discípulo da Escola de Alexandria, amigo e médico do imperador Juliano. Oribásio escreveu, em meados do século IV, uma obra de cerca de 70 volumes chamada Collecta Medicinalis, uma recompilação de todo o conhecimento médico de então, da qual chegaram até nós apenas alguns fragmentos. Escreveu também um resumo dessa obra, que chamou de Synopsis, em 9 volumes, que teria sido destinado à instrução de seu filho. Fato digno de nota é que na obra de Oribásio não existem referências a fórmulas mágicas ou espaço para a superstição, característica comum nos médicos que escreveram em época posterior.
Alexandria continuava sendo o principal centro de formação de médicos, de orientação científica. Os estudos de anatomia encontraram ali avanços notáveis e chegaram a ser realizadas dissecações de cadáveres, depois proibidas. No reinado de Justiniano, no século VI, a medicina ainda era valorizada, ocupando lugar destacado na cultura do Império. Aecio de Amida (Mesopotâmia), que viveu entre 502 e 575, que teve sua formação também em Alexandria, foi um dos importantes autores dessa época produzindo obra de 16 volumes (igualmente uma compilação do conhecimento médico), baseada nos clássicos gregos, em Galeno e Oribásio. Um desses livros, o tomo VII, foi durante longo tempo considerado como o mais completo livro sobre oftalmologia. Embora contivesse algumas fórmulas e remédios milagrosos e de características que hoje entendemos como supersticiosas, a obra de Aécio é considerada de grande importância para o conhecimento médico. São notáveis suas observações sobre parasitoses intestinais, individualizando áscaris, tênias e oxiúros e propondo tratamento específico para cada um deles, baseado em medicamentos extraídos de plantas. Aécio foi também responsável pela introdução no Império Romano de drogas como a cânfora, cravo da Índia, cujas ações terapêuticas já eram conhecidas no Oriente.
Alexandre de Tralles (na Ásia Menor, perto de Efeso) contemporâneo de Aécio, (viveu de 525 a 605) proveniente de família ilustre, escreveu várias obras que também influenciaram o ensino médico por vários séculos. De sua obra destacam-se estudos sobre as febres, parasitoses, oftalmologia, além de um tratado em 11 volumes chamado “Terapêutica”, que logo foram traduzidos para o hebraico, árabe e latim. Valorizava a semiologia, a sutileza dos sinais clínicos. Preconizava a necessidade de um correto diagnóstico que levaria a uma terapêutica eficaz, que só deveria ser instituída depois que se descobrisse a causa das doenças. Quando isso não era possível, ou quando não se conhecia tratamento eficaz para determinado mal, admitia fórmulas mágicas, “que os pacientes apreciam e às vezes se mostram eficazes”. Edições de sua obra foram impressas até o século XIX, mais intensamente no século XVI e largamente utilizadas no ensino médico. Alexandre de Tralles iniciou sua carreira em Constantinopla, e depois atuou de maneira itinerante na Espanha, Gália e Itália, fixando-se finalmente em Roma, onde gozou de grande reputação.
Outro autor que merece ser citado é Paulo de Egina (ilha do Mar Egeu), cuja obra também influenciou por longo tempo a formação médica na Europa, particularmente no que se relaciona à cirurgia. Escreveu um tratado de medicina em 7 volumes, que é mais conhecida pelo seu nome latino: Epitomae medicae libri septem, que compendia o conhecimento médico até então. O sexto livro, que fala sobre cirurgia é o mais conhecido e foi obrigatório na Universidade de Paris por vários séculos. Existem traduções latinas impressas na França do século XVI e uma tradução inglesa foi publicada no século XIX. Ocupou-se de cirurgias como flebotomias, laqueaduras de vasos, traqueotomia, amigdalectomia, cauterizações, tratamento de hemorróidas, etc. Teve destaque seu tratado sobre a urina, em 7 volumes, onde descrevia as características da urina normal e anormal, preconizando que do seu exame poderiam ser obtidas valiosas informações sobre diagnóstico, prognóstico e tratamento. Pouco se sabe da vida de Paulo de Egina, que provavelmente viveu entre 625 e 690. Residia em Alexandria, quando da invasão árabe em 640.