No primeiro terço do século XIX, principalmente a partir da França, a medicina experimentou uma verdadeira revolução no conhecimento.* O médico Pierre Charles Alexandre Louis (1787-1872) foi certamente um dos revolucionários franceses que ajudou a modificar o modo de pensar dos médicos e sua influência é sentida ainda hoje. Pierre Louis era extremamente minucioso em suas observações clínicas e foi o introdutor do método estatístico, ou método numérico e teve participação fundamental no desenvolvimento da moderna epidemiologia.

Seu principal trabalho foi Recherches sur les effets de la saignée dans quelques maladies inflammatoires et sur l’action de l’émétique et des vésicatoires dans la pneumonie, num artigo publicado em 1828 e depois revisado, num livro em 1835. Nessa obra, Louis selecionou 77 casos de pneumonia com características clínicas semelhantes, procurando neutralizar algumas variáveis que influenciavam no curso natural da doença e fez um estudo estatístico correlacionando a evolução da pneumonia com o tratamento feito por sangrias. 

Embora hoje nos pareça um tratamento absurdo, as sangrias e a utilização de sanguessugas eram utilizadas em larga escala no início do século XIX, muito por conta das teorias de Broussais que gozavam de grande prestígio no meio médico. Para Broussais, as doenças teriam sempre como inflamações, o organismo se defenderia de irritantes existentes em algum ponto. As sangrias eram preconizadas por ele, não mais para eliminar os humores nocivos da teoria hipocrático-galênica, mas para combater essas inflamações. 

No seu trabalho, Pierre Louis comparou a evolução das pneumonias com a época em que foram introduzidas as sangrias. Observou que o número de mortes era muito maior naqueles pacientes em que a sangria havia sido introduzida mais precocemente. Morreram 44% dos pacientes submetidos à sangria nos estágios mais iniciais e 25% daqueles em que o processo de sangramento foi mais tardio.

Curiosamente, seu trabalho mostrou também que a doença durava menos tempo nos sobreviventes do grupo em que a sangria foi iniciada mais cedo. Na verdade, a conclusão de Louis não foi pela condenação da sangria, mas pela limitação de seu uso.

A importância de Pierre Louis para o desenvolvimento da epidemiologia é evidente, por conta do estímulo à criteriosa observação do paciente, da aplicação de técnicas estatísticas, no estudo comparativo entre grupos com características semelhantes, na possibilidade de extrapolação de suas observações ao restante da população.

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